O QUE NÃO SE VÊ

Diário de Notícias, 20081227
João Miranda
Investigador em biotecnologia - jmirandadn@gmail.com

A demonização da classe política faz parte dos rituais democráticos. De acordo com a voz popular, os políticos são incompetentes, demagogos, mentirosos e corruptos. E, no entanto, o eleitorado tem grandes expectativas sobre o papel do Estado na sociedade. O eleitor espera que, perante uma crise, o Governo faça alguma coisa. Espera que o Governo apresente soluções. Paradoxalmente, a crise fez baixar o nível de exigência e reduziu os níveis de cepticismo em relação aos políticos. Como que por magia, a classe política é vista como uma fonte de esperança no futuro, apesar de ser responsável pela crise e de ser considerada incompetente e demagoga.A obra de Frédéric Bastiat, um economista francês do século XIX, pode ajudar a esclarecer este paradoxo. Bastiat observou que as medidas políticas de carácter económico têm consequências visíveis e consequências invisíveis. Por exemplo, os subsídios à actividade económica têm como efeito visível a criação de emprego pelas empresas receptoras. Têm, no entanto, um efeito invisível que é imperceptível para a maior parte dos eleitores. O Estado só pode pagar subsídios às empresas se cobrar os correspondentes impostos. Logo, o emprego criado pelos subsídios é compensado pelo desemprego criado pelos impostos.Os políticos centram-se nas medidas com efeitos visíveis positivos, mesmo que os respectivos efeitos negativos invisíveis excedam os positivos. O eleitor comum, que não leu Bastiat, avalia as propostas políticas de acordo com os seus efeitos visíveis. Estará sempre predisposto a acreditar em propostas concretas com efeitos visíveis positivos. O mesmo eleitor poderá estar insatisfeito com o estado geral do País e com a classe política em geral, embora não entenda muito bem porquê. Como o eleitor não se apercebe da contribuição dos efeitos invisíveis para a deterioração do estado geral do País, mantém uma relação esquizofrénica com a política. O eleitor está sempre entusiasmado com as novas medidas e sempre insatisfeito com o resultado global das medidas que o entusiasmaram no passado.

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